VEÍCULO TÍTULO
caramure.blog Entrevista - Albino Rubim – Parte Ii
Perguntas Enviadas: ALEILTON FONSECA, MATILDE MATOS, PAULO DOURADO, RODRIGO MORAES
Fotografia: MÁRZIA LIMA
DANIEL REBOUÇAS: Segundo foi comentado, em entrevista dada pelo senhor a Samuel Celestino, alguns órgãos ligados a SECULT, como a Fundação Pedro Calmon, não poderão mais receber apoio para seus projetos. Como a Secretaria pensa na sobrevivência e maior efetividade desses órgãos ligados a ela?
ALBINO RUBIM: Estamos falando de verbas orçamentárias! É claro que o montante para cultura é pequeno, mas existem verbas orçamentárias tanto para SECULT como para suas vinculadas. O que acontece é que esse recurso do orçamento não é suficiente pra tudo que a comunidade cultural demanda. Assim nós temos que buscar alternativas via leis de incentivo, via Fundo de Cultura... Hoje mesmo eu cheguei aqui da assinatura de um convênio com a “OI”. A “OI” está colocando dezoito milhões no Fundo de Cultura. Isso é importante para nós, eles não estão colocando na lei de incentivo. Estão colocando no Fundo, que é um mecanismo de financiamento muito interessante para nós, pois neste quem define os projetos que vão ser apoiados, são comissões em pares...
"A “OI” está colocando dezoito milhões no Fundo de Cultura”
FERNANDO: Neste caso como é que ela tem o retorno dela?
ALBINO RUBIM: Ela aparece como uma das patrocinadoras e investidoras do Fundo de Cultura. Mas ela não está decidindo (...)
FERNANDO OBERLAENDER: Pode ser um caminho.
ALBINO RUBIN: Certo! Pode ser um caminho...
EDUARDO MATTEDI: Neste caso ela está confiando nos setoriais que vão decidir...
ALBINO RUBIN: ...Aliás, a Petrobrás, hoje em dia, naquele programa Petrobrás Cultural, convoca uma quantidade de técnicos da área da cultura e essas pessoas analisam os projetos que acreditam que têm mais mérito, e a Petrobrás patrocina. Não digo em todos os projetos porque alguns são de interesse da empresa, mas ela está bancando porque aquela comissão de especialistas decidiu que aqueles são bons. Esses pares são os que têm maior condição de julgar... O pessoal que trabalha com cultura popular certamente é o pessoal que tem mais qualificação pra escolher, por que eles conhecem o assunto, o pessoal de cinema, o pessoal de teatro, pessoal de música... E não são as pessoas do departamento de marketing de uma empresa ou, muitas vezes, da Secretaria de Cultura.
FERNANDO: A gestão de Márcio gerou uma polêmica em relação ao sustento, de algumas entidades privadas de cunho cultural, por exemplo, a “Fundação Casa de Jorge Amado”, a “Academia de Letras”, o Instituto Histórico... Acontece que o estado continua bancando a parte administrativa de algumas dessas instituições (...)
ALBINO RUBIM: O que aconteceu, na verdade, é que se tem uma relação entre o estado e algumas entidades privadas ligadas a cultura e de extrema importância. Ninguém está desconhecendo isso. Mas não haviam regras para incentivo desse tipo de entidade. Por exemplo, uma determinada fundação, recebia uma quantia imensa de dinheiro, já outra recebia outra grande quantia. Então se tinha uma norma para os investimentos. Era tudo na lógica do favor, aqueles que são mais amigos do “rei”, têm mais, os que não são, tem menos. Então é nessa lógica que funcionava. Todo mundo aqui sabe disso, eu não estou falando nenhuma novidade, não estou inventado nada, estou dizendo uma coisa que todo mundo sabe. Veja, e algumas dessas instituições recebiam muito dinheiro, muito dinheiro em relação ao orçamento da Secretaria de Cultura, um volume substancial de dinheiro. Então o que se fez? Foi feito uma disciplina disto. Hoje você tem um programa na Secretaria onde qualquer instituição que queira, pode concorrer. Está aberto, é republicano e público, é um sistema de apoio permanente a instituições culturais, coisa que acho justíssimo. O estado deve ajudar e não bancar, são coisas completamente diferentes.
"Hoje você tem um programa na Secretaria onde qualquer instituição que queira, pode concorrer. Está aberto, é republicano e público, é um sistema de apoio permanente a instituições culturais(...). O estado deve ajudar e não bancar, são coisas completamente diferentes. "
FERNANDO: E isso tudo funciona assim?
ALBINO RUBIM: É, isso tudo funciona assim, o que nós queremos com isso é estimular que outras entidades entrem nesse processo, entidades não só da capital, porque isto está só em Salvador.
FERNANDO: Você não acha que dentro destas instituições, umas têm por se só uma característica de sustentabilidade e outras não? Por exemplo, o Instituto Geográfico e Histórico da Bahia, não tem como se sustentar. Mas existem outras que têm a capacidade de se manter (...)
ALBINO RUBIM: Um dos critérios que podem ser analisados por estas suposições, é levar em conta isso. Aquelas instituições que têm a possibilidade de sustentabilidade devem receber menos ou até receber nada (...)
FERNANDO: Ou receber por projetos
ALBINO RUBIM: Sim por projetos também. Mas eu acho importante receber um apoio mais permanente, porque uma instituição que não consegue isso e conta só com o apoio de projetos, fica numa situação muito complicada...
FERNANDO: Vou dar um exemplo: A “Fundação Portinari”, esta fundação é exemplar. Funciona, se autossustenta e vive das obras de Portinari. É claro que ela pode ter um apoio para um projeto ou outro...
ALBINO RUBIM: Eu penso no seguinte, se é uma fundação que tem possibilidade de sustentabilidade, eu concordo com você. Ela deve se sustentar e deve trabalhar em cima de projetos. Agora outras fundações não têm essas características, se não tiverem este apoio correm o risco de fecharem, o que é um prejuízo cultural grande.
FERNANDO: A exemplo do Instituto Histórico que não pode viver sem apoio.
RODRIGO MORAES: O senhor declarou em um recente artigo que o museu do carnaval para ser concretizado precisaria de uma construção coletiva, como se daria isto?
ALBINO RUBIM: Veja. Eu não acho que deva ser um museu do carnaval e sim, uma casa, uma instituição, ligada a esta festa. É um absurdo a Bahia não ter uma memória do seu carnaval, que é uma manifestação popular com tanta mutação, com tanta criação nova e historicamente mutável. Então, este espaço, teria a história de tudo isso; da música, das vestimentas, dos vestuários, da forma de organização, das decorações...
Para mim, essa instituição, não deve ser bancada apenas pelo estado porque existe na Bahia uma cultura do carnaval, um conjunto de entidades ligadas a essa festa que tem uma grande sustentabilidade e portando elas poderiam colaborar com o estado e criar uma parceria entre poder público e privado.
Em Lisboa existe o Museu do Fado. É um museu pequeno até. Você vai lá e quer ouvir um fado de 1930. Você ouve o fado de 1930! Você quer saber de um cantor, de um compositor? Clica lá e tem informação sobre ele. É genial isso. A gente não podia ter uma coisa dessas em Salvador?
EDUARDO MATTEDI: Um conceito moderno de museu!
ALBINO RUBIM: Um conceito super moderno, super contemporâneo, super high tech, super dinâmico, que uma criança possa ir lá mexer. Seria uma maravilha se isso fosse localizado na região do Pelourinho. Agregaria uma visitação imensa e para o pessoal do carnaval seria bom. Nesse museu, nessa casa, nessa instituição pode ter até uma sala Daniela Mercury, sala Ivete Sangallo, sala Carlinhos Brown..., agora, que tivesse um aporte deles, participando de tudo. A Bahia já tem uma visão grande pelo carnaval, agora teria uma visão internacional, também pelas atividades paralelas a ele.
FERNANDO: Na década de 70, o carnaval de Salvador era conhecido como “carnaval participação”. Hoje isso não acontece porque o carnaval foi loteado e o folião que vai pra pipoca, não tem espaço. O senhor como secretário pretende trabalhar para mudar essa relação?
ALBINO RUBIM: A primeira questão é que o carnaval não é gerido pela Secretaria de Cultura, nem sequer pelo estado. Apesar do mesmo ter investido 55 milhões nesse ano. Claro, uma parte desses recursos vai para segurança pública, que são 24 milhões. Nós da Secretaria pusemos 10 milhões. Apesar disso, o carnaval é uma festa municipal e, portanto disciplinado pela prefeitura e pelo Conselho Municipal do Carnaval. Uma coisa fundamental é a ordem do desfile e quem define é o município. Lembrem que no Rio de Janeiro, esta ordem é sorteada todo ano, na Bahia não. Na Bahia a ordem do desfile é um grande negócio. Por que é um grande negócio? Porque todos querem sair no horário nobre, para aparecer na televisão, nos jornais, ter visibilidade nacional. Isso joga para determinados horários alguns blocos. Eu fico pensando assim: seria maravilhoso, se nosso carnaval tivesse um bloco afro, um bloco de afoxé, intercalados... Qual é o horário dos blocos afros no carnaval?
Existe uma estrutura que precisa ser mudada, democratizada. Nós fizemos uma pesquisa sobre o carnaval e 60% dos foliões que brincam são pipoca. O que é que tem esse carnaval que nós oferecemos hoje pro folião pipoca? Tem alguns poucos trios independentes, e tudo tem corda... Três quintos dos nossos foliões são pipoca, brincam dessa maneira, então é preciso se ter uma festa que atenda esse público.
"Na Bahia a ordem do desfile é um grande negócio. Por que é um grande negócio? Porque todos querem sair no horário nobre, para aparecer(...)”
FERNANDO: A Secretaria como participante desse processo de financiamento não poderia interferir um pouco nisso?
ALBINO RUBIM: Talvez a pergunta comece: O governo do estado botando tantos recursos, não pode interferir nisso, apesar, da festa ser municipal? Talvez sim. A Secretaria tem seu âmbito específico de intervir nisso. Qual seria esse âmbito? Temos o carnaval do Pelourinho, que é todo bancado por nós! Esta parte da festa nós queremos transformar cada vez mais no carnaval da diversidade. Existem vários largos ali. Então que tenha, um espaço pra criança, porque é legal que tenha baile infantil, isso acabou praticamente em Salvador. Outro lugar que tenha um carnaval mais antigo, pro pessoal mais idoso poder aproveitar. Outro com música eletrônica pro jovem. Isso é uma boa contribuição. Existe também o carnaval do negro que é fundamental pra manter a diversidade da festa. Os blocos afros e afoxés têm uma dificuldade imensa de ter patrocínio porque saem à noite, ninguém quer botar dinheiro...
"Existe uma estrutura que precisa ser mudada, democratizada. Nós fizemos uma pesquisa sobre o carnaval e 60% dos foliões que brincam são pipoca.”
FERNANDO: Quanto custa o carnaval no Pelourinho?
ALBINO RUBIM: O carnaval do Pelourinho custou R$ 1,5 milhões.
FERNANDO: Mais barato que barba de Bel do Chiclete!
ALBINO RUBIM: Todo aquele carnaval que agente vê no Pelourinho, que aliás, esse ano foi animadíssimo e que os turistas estrangeiros, pelos dados da Bahiatursa, preferiram!
FERNANDO: Muito mais plural!
ALBINO RUBIM: Esse ano aquele show da percussão, no primeiro dia, foi maravilhoso. A nação zumbi foi ótima. Depois o show das mulheres que também foi legal. Quer dizer, existe uma diversidade ali e nós queremos aprofundar. Outra coisa que pode colaborar também, é com relação ao carnaval pipoca. A Secretaria está discutindo agora para ter uma definição mais clara sobre o assunto pensando numa intervenção voltada exclusivamente para o folião pipoca, com trios independentes, colocando determinados blocos que não tem corda, na rua. A condição é não ter corda.
"A Secretaria está (...) pensando numa intervenção voltada exclusivamente para o folião pipoca, com trios independentes, colocando determinados blocos que não tem corda, na rua. A condição é não ter corda.”
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