CARTA ABERTA AO SECRETÁRIO DE ESTADO DA CULTURA DA BAHIA
Salvador, 20 de Janeiro de 2011
Excelentíssimo Senhor Secretário Prof. Dr. Albino Canelas Rubim
C/C: Casa Civil, Governadoria e Ascom do Governo Estadual
No ensejo das boas vindas à Vossa gestão e de novas perspectivas para a cultura estadual, nós, profissionais, professores, pesquisadores e estudantes do campo da museologia e dos museus, explicitamos nesta carta, considerações e expectativas quanto à formulação e/ou reformulação das políticas públicas relativas ao campo dos museus, do patrimônio cultural e da memória social.
Em maio de 2003, o Governo Federal convocou os profissionais do campo museal para discutir a criação de uma política de estado voltada para as necessidades, desafios e prioridades dos museus e da Museologia em todo o território nacional, articulada com o Plano Nacional de Cultura (PNC).
O debate amplo e participativo realizado no Museu Histórico Nacional foi um marco para a construção da Política Nacional de Museus (PNM), que completou oito anos em 2010 e tem como um dos seus principais resultados a criação do Estatuto de Museus e do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram).
São princípios norteadores da PNM:
Estabelecimento e consolidação de políticas públicas para os campos do patrimônio cultural, da memória social e dos museus, visando à democratização das instituições e do acesso aos bens culturais;
Valorização do patrimônio cultural sob a guarda dos museus, compreendendo-os como unidades de valor estratégico nos diferentes processos identitários, sejam eles de caráter nacional, regional ou local;
Desenvolvimento de práticas e políticas educacionais orientadas para o respeito à diferença e à diversidade cultural do povo brasileiro;
Reconhecimento e garantia dos direitos das comunidades organizadas de participar, com técnicos e gestores culturais, dos processos de registro e proteção legal e dos procedimentos técnicos e políticos de definição do patrimônio a ser musealizado;
Estímulo e apoio à participação de museus comunitários, ecomuseus, museus locais, museus escolares e outros na Política Nacional de Museus e nas ações de preservação e gerenciamento do patrimônio cultural;
Incentivo a programas e ações que viabilizem a conservação, a preservação e a sustentabilidade do patrimônio cultural submetido a processo de musealização;
Respeito ao patrimônio cultural das comunidades indígenas e afrodescendentes, de acordo com as suas especificidades e diversidades.
Ao estado da Bahia coube o desafio de desenvolver e implementar o Eixo 3 da PNM: Programa de Formação e Capacitação em Museologia - Projeto Bahia. Assim, de 2003 a 2005, foi reunido um grupo formado por museólogos, estagiários do curso de museologia, representante da Prefeitura Municipal de Salvador e da Universidade Federal da Bahia, sob a coordenação da Profª Drª Maria Célia Teixeira Moura Santos, indicada pelo extinto Departamento de Museus e Centros Culturais (DEMU), hoje Ibram.
A partir dessas ações, novos paradigmas foram estabelecidos para a gestão dos museus baianos. Hoje, podemos dizer que trabalhamos com um conceito ampliado de cultura, definida como fenômeno social e humano de múltiplos sentidos, como manifestações que têm força simbólica e reconhecimento nas sociedades.
Em oito anos, o campo museal brasileiro fortaleceu-se de forma histórica e ganhou renovada importância cultural e social, consolidando uma legislação própria, inédita na história do país e uma das pioneiras na América Latina. Os museus brasileiros estão em movimento. Por isso, interessa-nos compreendê-los em suas potencialidades, seus enfrentamentos e dinâmica social, no âmbito de uma política pública de Estado. Os museus, como equipamentos da cultura, também são espelhos da nossa sociedade e devem ser explorados nessa dimensão.
Entretanto, nos últimos anos, a Diretoria de Museus (DIMUS) do IPAC optou por um modelo centralizador de gestão que enfraqueceu os museus a partir da desarticulação das equipes técnicas e eliminação dos diretores de unidades, habilitados a atuar nas especificidades de cada instituição. Os museus baianos deixaram de ser território de experimentações e práticas de fazeres e saberes - envolvendo os diversos públicos - para atender a interesses individualistas e de autopromoção, sobretudo, através das megalomaníacas curadorias que privilegiaram exposições temporárias de alto custo, em detrimento à salvaguarda dos nossos acervos.
Os acervos, por sua vez, se encontram em estado precário de armazenamento, dispostos em locais inapropriados, o que compromete a preservação, a conservação e a segurança do nosso patrimônio, descumprindo o artigo 23 do Estatuto de Museus. Ademais, não houve o cumprimento da Lei 11.904/2009, art. 44, que trata da construção de planos museológicos para as unidades museais, condição sine qua non para o desenvolvimento dos programas, quais sejam, de acervos (aquisição, documentação e conservação); arquitetônicos; expográficos; socioeducativos; de segurança; de comunicação e pesquisa; de recursos humanos e econômicos.
Outra questão grave, com conseqüências imensuráveis para a museologia e consequentemente os museus, tem sido o distanciamento estabelecido entre as instituições museais e os centros acadêmicos o que alijou os nossos museus do processo de ensino-aprendizagem e comprometeu a produção de conhecimento. Essa conjuntura adversa, acentuada nos últimos quatro anos, compromete os avanços das políticas públicas conquistadas através da PNM que, antes de tudo, é uma recomendação nacional. Vale ressaltar, que a PNM não foi compreendida nas suas especificidades, pela gestão responsável em questão. Em conseqüência, os museus não conseguem atuar com eficácia no que se propõem, enquanto espaços catalisadores da cidadania e da identidade cultural.
Com o objetivo de avançarmos nas políticas culturais de Estado, nós, profissionais, professores, pesquisadores e estudantes do campo da museologia e dos museus, objetivamos:
1º - Postular o compromisso da Secretaria de Cultura do Estado da Bahia com uma política pública voltada à preservação e democratização de acesso à memória cultural.
2º - Que o gestor responsável pelos museus da Secult, escolhido por V.Sa., tenha uma postura coerente com os interesses do campo museal.
3º - Que haja incentivo às pesquisas no campo do patrimônio cultural, da memória e dos museus, através de seus pesquisadores, das universidades e dos grupos de pesquisas.
4º - Que a Política Nacional de Museus seja compreendida e implementada no Estado da Bahia.
5º - Investimentos nos programas de museologia social.
6º - Que os museus possam contar com diretores e equipes técnicas próprios, com autonomia de gestão e que haja subsídios para implementação do Plano Museológico.
Colocamo-nos à disposição para contribuir, de forma participativa, na construção de uma política cultural articulada com as demais políticas de Estado, com vistas à consolidação de uma cidadania cultural com valorização ao direito à memória, direito aos museus.
Cientes da Vossa compreensão desde já agradecemos e abaixo assinamos:
Ademir Ribeiro Junior - Arqueólogo do Iphan/MinC
Alessandra do Carmo Garcia – Coordenação Geral de Sistema de Informação Museais/Ibram/MinC
Amanda de Almeida Oliveira – COREM 1R 0291-I -Coordenação Geral de Sistema de Informação Museais/Ibram/MinC
Ana Paula Soares Pacheco – Coordenadora do Curso de Graduação em Museologia/UFRB
Carla Maria Costa da Silva – COREM 1R 0187-I – Memorial Irmã Dulce
Carlos Alberto Santos Costa – COREM 1R 0211-I – CAHL/UFRB
Diego Rabelo – RG.8760-8438 – Estudante de museologia e Diretor JPT- Bahia
Dilserôse Côrtes Costa - COREM 0301-I
Isabela Marques Leite de Souza COREM 3R 126-I - Museu das Missões/IBRAM/MinC
Luciana Palmeira da Silva – COREM 1R 0241- I - Departamento de Processos Museais/Ibram/MinC
Luiz Alberto Ribeiro Freire – COREM 1R 090 – EBA/Universidade Federal da Bahia
Luzia Gomes Ferreira – COREM 6R 040 – FAM/Universidade Federal do Pará.
Marijara Souza Queiroz - COREM 1R 0228- I – Departamento de Processos Museais/Ibram/MinC
Michel Correia - COREM 4R 166-I – Coordenação Geral de Sistema de Informação Museais/Ibram/MinC
Paulo José Nascimento Lima – Corem 4R – 157.I – Museu Lasar Segall/IBRAM/MinC
Rita de Cássia Vale – COREM 0202-I – Diretora ONG Moinhos Giros de Arte Cultura e Comunicação
Rosangela Karine Pinto Esteves COREM 1R 0277-I - Coordenação Geral de Sistema de Informação Museais/Ibram/MinC
Tais Valente dos Santos - COREM 1R 0294- I - Departamento de Processos Museais/Ibram/MinC
Valdemar de Assis Lima - COREM 1R 0242-I – Departamento de Processos Museais/Ibram/MinC
Paloma Bensabat Calvano – COREM 2R 0864-I - Coordenação Geral de Sistema de Informação Museais/Ibram/MinC
DJ VJ Koyrana Duo Jazz Fusion Bob Caê Ben
Um comentário:
É de fundamental importância ressaltar que nosso movimento é contra uma política de gestão que, à luz da Lei 11.904 de 2009 – Estatuto de Museus e dos principios norteadores dos tratos com o patrimônio e a memória cultural, nos é nefasta. A valorização das instituições do interior do estado da Bahia é uma das premissas da Política Nacional de Museus - PNM. Em 2004, a PNM enviou profissionais de museus a diversos municípios baianos, que fizeram um mapeamento e análise do tecido museal estadual, para a construção do Perfil dos Museus Baianos, além de realizar, com êxito, seminários de divulgação da PNM, convocando todos profissionais a participar desse importante momento histórico. Já as iniciativas da atual gestão da Dimus, em relação às isntituições do interior do estado, foram tímidas e incipiente, diante da grande necessidade dessas instituições.
Nosso manifesto apóia enfaticamente a criação do Instituto Baiano de Museus -Ibam, em uma perspectiva de construção democrática, holística e em consonância com a Política Nacional de Museus, com vistas a valorização dos museus, porquanto espaços, principalmente, de fruição da memória, direito à cultura e inclusão sociocultural.
Destarte, pretendemos o fortalecimento da Secult, a partir da valorização dos museus e dos diferentes profissionis que neles atuam, mediante a construção de um modelo de gestão sensível, democrática, ética, responsável e inteligente dos museus baianos, em contraponto ao improfícuo modelo vigente.
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