“Dá pra ir longe sabendo driblar o mofo da vida! Quero me transformar, não sou um produto acabado, venho com muitos defeitos, meu manual de instruções se perdeu, mas quero a mudança. Utopia hoje, carne e osso pro final de semana. Mas com um pé na estrada.”
(Marcelino Pintho, escritor calmonense, no jornal Vírus, nº 40, março/2010)
“E, ao final de nossa exploração, chegaremos onde começamos. E conheceremos o lugar pela primeira
vez.”
(T. S. Elliot, poeta norte-americano)
1. FELIZ AQUI E NÃO ALÉM: ESCREVO PARA TAMBÉM DAR UM SENTIDO A ESSA VIDA
Estou na área, e se derrubar é pênalti. Sem querer agredir ninguém, mas também não aceitando o desaforo nem compactuando com a hipocrisia alheia. Para essa aí, fica o meu desacato. É como sempre afirma o colunista da Folha José Simão: “BUEMBA! BUEMBA! Direto do País da Piada Pronta!” Num País caótico como o nosso, é para rir ou para chorar?
Escrevo direto de Jacobina, no interior da Bahia. Sou um homem simples, do povo, que tenta ver o mundo de um modo diferente, mas que também tenta respeitar a visão dos outros e aceitar os seus pontos de vista. Não tenho cargos políticos, nem influência junto ao poder. Minhas únicas armas são minhas ideias, caneta, papel e o computador.
A palavra que mais admiro é CONTESTAÇÃO, pois temos que ter o poder de duvidar, de retrucar, de refazer e recriar. Também concordo que é melhor ser indignado do que alienado. E por isso, escrevo: porque sou um cidadão sempre indignado. Claro que sei que esse meu estilo crítico, incomoda àqueles que estão acomodados, felizes por suas vidinhas cotidianas; alguns se sentem ofendidos ou atingidos em seus anseios e interesses pessoais, que são mesquinhos. Mas sou assim: não escrevo para agradar, não faço concessões, e não tenho medo. Conheço meus direitos e sei que, junto com eles, estão meus deveres enquanto cidadão. Não sou fantoche de ninguém; sei também que não sou dono da verdade, mas busco a cada dia errar menos e acertar mais. Isso é ter ética e respeito pelo ser humano, pelo leitor.
Não quero compactuar com a “síndrome do consenso”. A “síndrome do consenso” é aquela doença que acomete a quem quer agradar a gregos e baianos – tipo o Jornal Nacional, do William “Hommer Simpson” Bonner, sabe? O Jornal Nacional é feito para falar com o índio do Xingú, para a dona Maria de Nazaré das Farinhas e para executivos da avenida Paulista. Nivela até transformar em algo parecido com leite desnatado: aguado, sem gosto, sem graça. Sorrisos irônicos, expressões de medo, angústia, raiva ou indignação por parte dos apresentadores são proibidos por causa das patrulhas. Comentários pessoais, nem pensar!
Então, a gente que escreve, de maneira alternativa, independente e rebelde, na verdade vamos representando um contraponto à mesmice reinante. Definitivamente, este não é o tipo de mundo, continente, País, estado e região em que queremos viver, não é mesmo? Por isso que a nossa escrita é crítica, ácida, corrosiva. Queremos mesmo desafinar o coro dos contentes e incomodar aqueles que se encontram acomodados. O nosso lema é: A FAVOR DO CONTRÁRIO DE TUDO O QUE ESTÁ AÍ.
A escritora Debbie Ford, num ótimo livro de 2010, nos faz este alerta: “Trabalharemos incessantemente para sermos vistos como acima da média, ou ficaremos contentes deitados diante da TV ou passando horas na internet procurando sites de fofocas?” Que chamada, hein? Sabemos que o nosso público, apesar de estar crescendo a cada dia, continua restrito, é uma minoria, porque a maioria das pessoas está alienada; muitas delas preferem comprar jornal para ver quem roubou e matou; preferem ver as novelas babacas da Vênus Platinada! Ou quando estão na frente de um computador, preferem ficar perdendo tempo com orkuts e sites duvidosos... Ao invés de discutir os porquês de tanta violência, miséria e roubalheira que nos afligem e procurar as possíveis saídas e soluções, preferem mesmo viver suas vidinhas medíocres e superficiais. Brasileiro adora reclamar, essa é a verdade!
Mas nós vamos continuar escrevendo. Escrevemos para tornar reais os nossos pensamentos, nossos pontos de vista, nossos desejos, nossas esperanças, nossas revoltas, nossas tristezas, nossas alegrias, nossos sonhos... Ao escrever, dialogamos primeiro com as nossas consciências.
2. “NÃO CANTAMOS ESPERANÇA, PORQUE NÃO VENDEMOS ILUSÃO”
Essa frase é de uma música do rapper Eduardo, do Facção Central. Além de boas músicas, a gente busca inspiração também em leituras de bons livros, bons sites e bons jornais. E também em e-mails encorajadores, como estes que seguem:
“Em primeiro lugar, parabéns pelos textos que você tem escrito, são muito inspiradores e elucidativos e me dão uma sensação de não estar sozinho. As mudanças são lentas, mas acontecem. Muitas vezes nos deprimimos porque achamos que a luta é vã, mas cada vez mais pessoas vão ‘se ligando’, embora pareça o contrário, diante de BBBs, novelas e (tele)jornalecos nacionais e locais que só chafurdam na lama ensanguentada, sem chegar à discussão do cerne dos problemas que afligem nossas sociedades. Reitero, parabéns. Continue pensando e escrevendo.”
(Joel Albus, por e-mail)
“Plagiando o nobre poeta, que ovacionou que a luta com as palavras é uma luta vã, reitero a minha admiração pelos seus textos. Não deixa de ser uma luta leal e honesta, pois você aborda fatos e acontecimentos que estão envoltos em nosso cotidiano, com uma linguagem sarcástica, que direciona suas convicções e que em muito nos emociona, a ponto de querermos ser homens das letras como você. Falo honestamente, debruçado a um texto articulado e provocador. Tenho a oportunidade de ler algo que pouco está corrompido pelo sistema. Continue tentando! Você está conseguindo despertar nas pessoas algo que parecia adormecido: a esperança.”
(Kleber Vasconcelos, por e-mail)
Escrevemos, porque é através da escrita que colocamos nossas opiniões, nossos pontos de vista. Não podemos calar diante de tantas injustiças e tantos desmandos: quando vemos em nossas cidades tantas pessoas catando lixo; quando vemos professores ganhando menos que um salário mínimo; quando vemos trabalhadores sem carteira assinada, na informalidade – o camelô também é gente! -; quando vemos tantas obras paradas; quando vemos que em muitas cidades pequenas ainda não há creches; quando vemos centenas de pais de família ser dispensados porque foram contratados por antigas administrações; quando vemos lixões poluindo as ruas, riachos e igarapés ao seu redor; quando vemos centenas de famílias prisioneiras de rendas cidadãs; quando vemos uma minoria viajando de avião fretado, passando férias em Fortaleza e o povo pobre, sem nada, trocando seu voto por cimento, dentadura ou dinheiro; quando vemos que não há prestação de conta do dinheiro público, e muitos pobres vão morar em morros e encostas, e no verão de todo ano é o mesmo corre-corre, o mesmo deus-nos-acuda!; quando vemos que no município só tem veículos sucateados e o município aluga imóvel de funcionário da própria prefeitura; quando vemos que, a cada nova gestão, as caras são sempre as mesmas; quando ouvimos no rádio notícias deturpadas...
Escrevemos para relatar a nossa indignação e sabemos que muitas pessoas gostariam de fazer o mesmo, mas por motivos óbvios não o fazem. Escrevemos porque queremos ter a nossa própria opinião. Queremos poder escolher melhor os nossos candidatos nas próximas eleições, consultando as nossas consciências e analisando direitinho o comportamento, vida e história deles. Escrevemos porque não queremos que nossos filhos tenham pais covardes. E um dia, esperamos que nossos anseios e sonhos sejam realizados, e se não mais pudermos escrever, queremos que as futuras gerações escrevam o que nós não conseguimos.
3. NÃO QUERENDO CONCLUIR, PARA CONTINUAR PERGUNTANDO
Nós vamos continuar dizendo NÃO ao NÃO! Quem não agüenta mais a leitura de certos jornais, com suas matérias pagas e mentiras semanais, deve procurar leituras alternativas, que vibrem em outra freqüência. O nosso compromisso é com a verdade. Estamos espalhando a nossa palavra, com o nosso senso crítico. Continuaremos na insistência, na persistência e na teimosia. Escrevemos porque é preciso dizer algo, é preciso acordar as pessoas, é preciso ser contrário a tudo o que está aí. A gente sofre um pouquinho, com a nossa escrita, mas também gozamos!
E, como já é de praxe, aqui vai um recado pro sistema: “Evitem certos tipos, certos ambientes. Evitem a fala do povo, que vocês nem sabem onde mora e como. Não reportem povo, que ele fede. Não contem ruas, vidas, paixões violentas. Não se metam com o restolho que vocês não vêem humanidade ali. Que vocês não percebem vida ali. E vocês não sabem escrever essas coisas. Não podem sentir certas emoções, como o ouvido humano não percebe ultra-sons.” (Trecho do livro Abraçado ao Meu Rancor, do escritor João Antônio)
É por isso que escrevemos.
Márcio Melo, professor em tempo integral e escritor nas horas vagas. Com algumas ideias do escritor Aldemir Bentes, de Maués, no Amazonas (http://blogdoaldemirdemaus.blogspot.com), do escritor Luciano Pires (www.lucianopires.com.br) e da escritora norte-americana Debbie Ford (www.debbieford.com).
*Outros textos do autor, você encontra neste site: www.webartigos.com.br (Acesse hoje mesmo!)
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